Imigrante Eterna, Portuguesa no Espírito

Monica Ribeiro Connelly

Um desabafo triste, mas com uma réstia de esperança!

Sou imigrante, nascida de família de imigrantes. Quer os avós maternos, quer os paternos, Alentejanos da terra, emigraram para Angola em busca de vida melhor, forçados depois a retornar a Portugal em 1974-75 sem nada e com direito a nada. Ainda assim, reconstruíram a vida. Assim é o Espírito Português!

Os meus pais, ambos, nasceram e foram criados lá. Vieram para Portugal já quase adultos e assim que puderam, voltaram a Angola, à terra mais sua que Portugal alguma vez foi. Emigraram em busca de uma vida melhor também. 

Mais tarde fomos em família para Macau. Depois do tsunami de 2004, restei eu que fui viver com um tio em Portugal pela primeira vez. O meu irmão permaneceu na Austrália, depois foi para Macau e por fim, retornou a Angola, o país das nossas origens, com uma breve passagem por Évora. Eu continuei em Portugal até 2017, dividindo o meu tempo entre Almada e Évora. Sempre que possível, no Alentejo! 

Desde 2017 que vivo nos EUA e daqui, se Deus quiser, não saio mais. Aliás, tenho até não só a cidadania, mas a naturalização americana. América, EUA, é um país construído por imigrantes. Talvez por isso me sinta em casa aqui, sempre fui imigrante! Mesmo no meu país nunca me senti completamente em casa. O espírito de imigrante não era compatível com aquele Portugal. O Portugal que me deram a conhecer no estrangeiro, descobri em 2005 que não era o mesmo! Tive vislumbres desse Portugal de outrora, por que me apaixonara ao ouvir histórias desde criança, no Porto, no Douro, na Madeira e no Alentejo…Portugal esse com que ainda me identifico!

Algo aconteceu que fez o país perder o Espírito. Como retornar? Não sei. Sou Portuguesa, com orgulho da nossa história, mas sinto o nosso espírito aventureiro, inovador, corajoso, persistente e pioneiro – a morrer.

Hoje vivo numa terra que não é minha, que fala uma língua que não é minha, onde há muita discussão e confusão. Mas que tem, pelo menos por enquanto, esse Espírito. A adaptação foi difícil no início, senti-me sozinha e com saudades de ouvir e falar a nossa língua. Pela primeira vez não encontrei ninguém que falasse português comigo. O espanhol era o mais próximo, mas confesso que detesto quando assumem a minha nacionalidade e começam a falar espanhol comigo. Nos EUA, fale-se inglês, por favor! E em Portugal, já agora acrescento, fale-se português! 

Fazer amizades em adulta não foi fácil, especialmente enquanto vivia numa pequena cidade no deserto do Oeste do Texas onde toda a gente já se conhecia. Mais do que a política, essas foram as minhas dificuldades durante os três anos que lá vivi. Isso, e a falta do mar. A falta de um qualquer corpo aquático! Graças a Deus, mudei-me para Washington, costa Oeste, para uma cidade à beira mar (no Pacífico). Uma cidade que nem é demasiado urbana, nem demasiado desapegada da terra. Afinal, as minhas raízes são alentejanas. Aqui encontrei o meu equilíbrio, sinto-me quase em casa, só falta mesmo a nossa comida e a família. 

Deste lado, rapidamente fiz amizades e pertenço a uma comunidade fantástica. Lancei um livro em Setembro e a comunidade, ao bom espírito imigrante, tem-me ajudado muito a promovê-lo. Aqui dão valor ao que é local, incluindo aos artistas e escritores. O convívio entre ser humanos é fácil e natural, apesar das diferentes raízes de onde vimos. Talvez seja o facto de estarmos rodeados de natureza. Talvez seja derivado da natureza da história de criação do país. No entanto, confesso que sinto falta de poder insultar alguém no trânsito, por exemplo, sem ninguém levar ofensa. Essa liberdade, ainda não chegou aqui, antes pelo contrário. 

Agora tenho filhos americanos, filhos de imigrantes como eu, mas que não sabem falar português. Ainda tenho esperança que aprendam um pouco comigo já que ainda são pequeninos. Eles vão conhecer Portugal pela primeira vez em breve. Quero-lhes mostrar o Portugal de outrora, dar-lhes a conhecer o verdadeiro Espírito Português.  O Espírito Aventureiro! O meu desejo é que eles continuem a carregar essa tocha. Eu continuarei a fazer o possível, aqui da América, pois verdade seja dita, eu acho que o meu Portugal querido, morreu mesmo antes de eu sequer nascer. Restam apenas as memórias de outrora, propagadas pelos livros de História… E por nós que por cá andamos, dispersos, poucos, mas vivos.

Seremos nós suficientes? Digam-me que sim…

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