Como resumir 20 anos de vida no estrangeiro? Antes do Natal falava com outros participantes do Vidas Sem Fronteiras sobre a lágrima que nos vem ao canto do olho quando começamos a avistar Lisboa lá de cima. É uma emoção. Só que, nos últimos anos, a emoção começa a ser menor porque Portugal continua a mudar sem que eu acompanhe as suas mudanças à mesma velocidade, e a certa altura é como se já não lhe pertencesse. Ao que alguém me responde: pertencemos sempre! Quero acreditar que sim.
A 7 de janeiro de 2001, recém-licenciada em Design Gráfico, voei de Lisboa para Londres, para fazer um estágio de 9 meses através do programa INOV-Contacto do AICEP. 9 meses que se transformam em 5 anos e meio num ápice e são seguidos por outros 14 anos e meio em Sófia, Bulgária. Não eram tempos de crise, muito pelo contrário, eram tempos em que queria explorar o mundo e ter experiências enriquecedoras.
Partilho aqui o que aprendi nestes 20 anos de vida adulta, no estrangeiro. Respondo por isso a algumas questões de como é viver do lado de lá da fronteira portuguesa.
Como é a adaptação a uma nova vida no estrangeiro?
Tudo depende de cada um, mas o que aprendi é que convém olhar para os pontos positivos de cada local. Há sempre coisas boas, e, menos boas. Ajuda também a ir com expectativas mais baixas, assim, todas as surpresas serão boas, ou pelo menos neutras, em vez de serem uma desilusão.
Quando me mudei para o Reino Unido em 2001, pensei que ia para um país mais “civilizado” do que Portugal. Como estava enganada. Há coisas piores do que em Portugal, como a limpeza, só para dar um exemplo. Entre as coisas boas, considero que é, ou era, muito fácil de viver lá, trabalhar ou estudar, assim como toda a oferta cultural de Londres.
Quanto à Bulgária, vim com expectativas baixas, muito baixas. Assim, nada me surpreendeu pela negativa, pelo menos depois de encontrar lojas deste século. Estava à espera de um país “pobre”, em preparação para entrar na UE daí a poucos meses, em 2007. No entanto, há tantas boas razões para viver na Bulgária, como a segurança ou a natureza.
É fácil encontrar trabalho localmente?
Quando falamos a língua e temos o direito de trabalhar no país, acho que temos sempre boas hipóteses de encontrar trabalho. Tudo depende obviamente do tipo de trabalho, assim como das expectativas pessoais. Na minha experiência, funcionou muito melhor contactar diretamente as empresas para as quais queria trabalhar do que responder a anúncios.
Numa altura em que estava a trabalhar como freelancer houve um diretor do departamento que me interessava, que disse-me que não estava a precisar no momento, mas para ligar dali a um mês. Eu liguei, e liguei talvez mais duas vezes até que me disse, ok vem cá, e consegui o trabalho. Na Bulgária, como não falo fluentemente a língua, é um pouco mais complicado, mas também consegui, em inglês.
É essencial falar a língua do país?
Como referi em cima, falar fluentemente pode ajudar a ter mais oportunidades de trabalho. No entanto, acho que depende do país e das empresas. Há países, como o Reino Unido, a Espanha, a Alemanha ou a França que é difícil aceitarem falarem outra língua que não a deles, no dia a dia. Outros, como a Bulgária, são mais abertos a fazerem um esforço para comunicar noutras línguas.
Em qualquer caso, para a nossa vida no estrangeiro, convém aprender pelo menos o básico para conseguir “sobreviver”. Comprar comida, pedir direções, ir ao médico, etc. Se não falarmos fluentemente, será mais difícil integrar-nos totalmente no país e cultura. Aqui, parece que serei sempre a estrangeira que troca os verbos, os géneros e vive numa bolha à parte dedicada à comunidade internacional.
Compensa emigrar para poupar dinheiro?
Tudo depende das condições. Por exemplo, se se tem um contrato local ou de expatriado. Geralmente se for expatriado as condições poderão ser bem melhores, já que muitas empresas pagam o alojamento assim como a escola dos filhos. Se for com contrato local é preciso ter em atenção o custo de vida do país de destino e o estilo de vida que se quer ter.
Pessoalmente, não acho que haja uma diferença significativa na relação entre salário/custo de vida entre Portugal, Inglaterra e Bulgária. Se a ideia é ficar em casa, sem sair para jantar fora, sem viajar, então poderá compensar. Em Londres, o melhor que fiz foi deixar de fazer o câmbio para o escudo e decidir se podia comprar algo ou não mediante o meu salário. Senão, não comprava nada de tão caro que tudo parecia.
Booking.comE como é ter companheiros de outras nacionalidades?
Ainda em Londres, comecei a estudar búlgaro com uma professora nativa casada com um inglês. Ela vivia em Inglaterra há mais de 20 anos e era nítida a nostalgia que sentia de viver longe da Bulgária. Noutra ocasião encontrei uma portuguesa no avião para Londres, casada com um brasileiro. Tinham vivido em Portugal, mas ele não se adaptou. Depois viveram no Brasil e ela não se adaptou. Decidiram então viver em “terreno neutro”, no Reino Unido.
Eu, conheci o meu companheiro francês em Sófia, depois de outros namorados estrangeiros. Para além de diferenças culturais facilmente superáveis, acho que o mais importante a ter em conta é a escolha de onde se vive. Pelo menos uma metade do casal terá de viver longe do seu país, o que a longo prazo pode vir a ser um problema. Quando há filhos e uma separação é inevitável, não se pode esquecer que o teletransporte de crianças para o outro lado do planeta ainda não foi inventado. Eu, por enquanto, continuo a viver o meu sonho de ter um filho com três culturas diferentes, uma da mãe, outra do pai e ainda outra do país onde nasceu e onde vive.
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